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Photo du rédacteurKaren Basso

KAILUNKA

*texto escrito em 15 de março de 2017

Há dias em que a saudade aperta o meu coração.

Hoje Montréal está mais cheia de neve do que nunca. Acho que nunca tinha a visto tão branca. E eu amo vê-la assim. A neve é linda, o inverno tem algo que nos remete à nossa força vital também. Mas essa conexão vibra diferente. Não sei ainda descrever bem, com palavras que me soem justas. O inverno em Montréal não é só magnificamente gelado. Ele é silencioso, sabe? Intimista, ele tem algo que me puxa para dentro de mim, de minha própria caverna.

Lugares do meu universo interior, que nunca visitava porque tinha medo de acessar enquanto morava em Brasília, hoje são refúgios, casas seguras em frente à dias de muito frio, neve, silêncio e introspecção.

Sinto ainda a Karen selvagem e brincalhona que tenho em mim, mas aqui sou levada a conhecer outros arquétipos meus… Por vezes grito para que ela desperte, mas ela não vem, e me pergunto se ela estaria doente, se estaria morrendo.

Sinto nascer coisa nova em mim e sinto que essa coisa é assim, como a força que emana desse lugar. Ela faz sentido para o novo contexto em que habito, mas está completamente desconectada do contexto de onde eu vim. Essa dualidade, creio eu, me seguirá para sempre, enquanto eu viver aqui. A expatriada, imigrante, residente permanente do Québec.

Tenho escolhido depositar minhas raízes em um solo diferente, que por vezes me parece difícil de acessar (no momento ele está com 60 cm de neve… imagine, você), buscando criar conexão com o quê me traduz como brasileira, ponta porãnense, homo cerratensis de nascimento, coração e gratidão. Agora aqui, sem ter a mesma música e as mesmas mãos que eu segurava ao girar no meu velho local, busco novas músicas e novos passos de dança…

Sigo agradecendo por haver locais de conexão. Sejam eles bailes, festas, matas ou florestas, cachoeiras de águas cristalinas ou lagos congelados, o planeta Terra manifesta sua força diferentemente em cada um de seus (en)cantos.

Em alguns dias devo lançar um projeto novo, que se chama KAILUNKA.

Ele está sendo construído com ousadia, na busca de coragem para compartilhar com o outro a minha busca por identidade, uma identidade em constante construção.

Mas aqui, no (quase pólo) Norte do mundo, essa construção vivente por vezes me deslumbra. E a saudade, aquela velha insana e desvairadamente sábia, vai sendo minha benadjore (*).

Sigamos todos juntos.

Por vezes, dando as mãos e dançando uma bela ciranda em gratidão.

Por que não, né?

Beijos.

Il y a des jours où la nostalgie me serre le cœur. Aujourd’hui, Montréal est plus neigeux que jamais. Je suppose que je ne l’eusse vu jamais si blanc. Et je l’aime voir comme ça. La neige est belle, l’hiver est quelque chose qui nous révoque à notre force de vie aussi bien. Mais cette connexion vibre différemment. Je ne sais pas encore bien décrire comment je me sens (même en portugais), avec des mots qui sonnent juste pour moi.  L’hiver à Montréal est non seulement tout simplement magnifique et froid. Il est calme, vous savez? Intime. Il a quelque chose qui me tire à l’intérieur de moi, de ma propre cave.

Lieux de mon univers intérieur, qui je n’ai jamais visité parce que j’avais peur, aujourd’hui sont des refuges, des maisons sages vers des jours très froids, vers la neige, le silence et l’introspection. Je sens encore la Karen sauvage et ludique que j’avais en moi. Mais ici je suis prise pour répondre à mes autres archétypes … Parfois je crie pour la réveiller, mais elle ne vient pas et je me demande si elle est malade, si elle est en train de mourir.

Je sens naître de nouvelles choses en moi et je pense que cette chose est ainsi, comme la force qui émane de ce lieu. Elle est cohérente en face à ce nouveau contexte dans lequel je vis, mais elle est complètement déconnectée du contexte où je venais. Cette dualité, je pense, me suivra toujours, pendant je vivrai ici. L’expatriée, l’émigrée, la résidente permanente du Québec.

J’ai choisi de déposer mes racines dans un sol différent, ce qui semble parfois difficile de pénétrer (au moment il y a 60 cm de neige pour l’accéder … vous imaginez), en cherchant à créer une connexion avec ce qui me représente comme une brésilienne, née à Ponta Porã, dénommée “homo cerratensis” de naissance, de mon cœur et de toute ma gratitude. Maintenant, ici, sans avoir la même musique et les mêmes mains que je tenais à tourner dans mon ancienne place, je cherche de nouvelles chansons et de nouveaux pas à danser…

Je continue à remercier d’avoir des lieux de connexion. Qu’ils soient les bals, les fêtes, les forêts, les chutes d’eau limpide ou les lacs gelés. La planète montre sa force différemment dans chacun de ses coins.

Dans quelques jours je lance un nouveau projet appelé KAILUNKA. Construit avec audace et courage à partager aux autres ma recherche d’identité, une identité qui est toujours en construction.

Mais ici, dans (ce presque polaire) le nord du monde, cette construction vivante parfois m’éblouit. Et la nostalgie, cette vieille passionnée et follement sage, en étant ma benadjore (*). Laissez-nous tous ensemble. Parfois, en tenant nos mains et en dansant de la danse circulaire en gratitude. Pourquoi pas? Bisous.

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